Educação dos filhos e a religião
O tema da educação dos filhos e a religião é tratado em vários trechos dos livros de G.I. Gurdjieff, como, alguns princípios que devem ser inculcados no ser humano desde a mais tenra idade:
- A esperança de receber uma recompensa, só se for merecida.
- Os remorsos de consciência, pelos maus tratos infligidos aos animais.
- O temor de magoar seus pais e educadores.
- A impassibilidade em relação aos diabos, serpentes e camundongos.
- A alegria de contentar-se com o que se tem.
- O pesar de haver perdido a benevolência dos outros.
- A paciência de suportar a dor e a fome.
- O desejo de ganhar seu pão o mais depressa possível.
Encontros com Homens Notáveis, G.I. Gurdjieff, pg. 61.
Sobre sua própria educação, Gurdjieff cita alguns casos:
"Meu pai tinha uma concepção clara, simples e perfeitamente definida da meta da vida humana. Dizia-me com frequencia, em minha mocidade, que a aspiração fundamental de todo ser humano deveria ser conquistar sua liberdade interior e preparar-se, assim, para uma velhice feliz. Segundo ele, tal meta tinha caráter tão imperioso e tão indispensável, que cada um deveria compreendê-la, sem procurar sarna para se coçar. Mas, para atingi-la, era necessário que, desde a infância e até à idade de dezoito anos, o homem adquirisse dados que lhe permitissem obedecer sem desfalecimento aos quatro seguintes mandamentos:
Primeiro: Amar seus pais.
Segundo: Guardar sua pureza sexual.
Terceiro: Demonstrar igual cortesia para com todos, ricos ou pobres, amigos ou inimigos, detentores de poder ou escravos, qualquer que seja a religião a que pertençam; mas permanecer livre interiormente e nunca confiar demasiadamente em nada nem em ninguém.
Quarto: Amar o trabalho pelo trabalho e não pelo ganho."
Encontros com Homens Notáveis, G.I.Gurdjieff, pg. 45 e 46.
Sobre a maneira com seu pai o educava, conta alguns aspectos nesse trecho:
"Como já disse, meu pai usava comigo, com vistas a minha educação, do que chamarei de perseguições sistemáticas.
Uma das mais marcantes dessas perseguições sistemáticas, de que deveria mais tarde, sentir muito vivamente o benefício indiscutível - efeito que não deixaram de observar aquele que estiveram relacionados comigo, quando das minhas expedições em busca da verdade, nas regiões mais desertas do globo - consistia em que, durante minha infância, isto é, durante o período em que se constituem, no homem, os dados para os impulsos de que disporá no curso de sua vida responsável, meu pai tomava, em toda a ocasião propícia, as medidas necessárias para que se estabelecessem em mim, em vez desses fatores de impulsos denominados aversão, asco, repugnância, covardia, pusilanimidade e outros, os dados correspondentes a uma atitude de indiferença com relação a tudo o que gera habitualmente tais impulsos.
Encontros com Homens Notáveis, G.I.Gurdjieff, pg. 50 e 51.
Gurdjieff sempre apontava que uma educação integral deveria englobar um desenvolvimento do intelecto, do emocional e do corpo, como se pode ver no texto a seguir:
"A educação é uma coisa muito complicada. Deve englobar tudo. Será mau, por exemplo, dar às crianças somente exercícios físicos. Em geral, a educação se limita à formação do pensamento. Força-se a criança a aprender de cor poemas, como um papagaio, sem nada compreender, e os pais ficam contentes quando ela consegue. Na escola, ela aprende tudo de forma mecânica e, após ser aprovada "com louvor", continua não compreendendo nada e não experimentando nada. Pelo pensamento é um adulto de quarenta anos, mas, em sua essência, permanece uma criança de dez. Em pensamento, não tem medo de nada, mas, em sua essência, é medrosa."
Gurdjieff fala a seus alunos, pg. 128.
Sobre sua forma de educar, ele comentava:
"A: Até que ponto a criança deve ser dirigida?
R: De modo geral, a educação de uma criança deve se basear no princípio de que tudo deve vir do seu próprio querer. Não se deve dar a ela nada numa forma acabada. Só se pode propor a ela uma idéia, guia-la ou até instruí-la indiretamente, partindo de longe e levando a ao ponto desejado a partir de outra coisa. Eu nunca ensino diretamente, do contrário os meus alunos não aprenderiam nada. Se quero que um dos meus alunos mude, parto de muito longe ou me dirijo a outro, e dessa maneira ele aprende.
É assim que isso deve ocorrer, porque aquilo que é dito diretamente a uma criança, ela o recebe mecanicamente e, mais tarde, ela se manifestará igualmente de forma mecânica."
Gurdjieff fala a seus alunos, pg. 131.
Em sua forma oriental de ensinar, Gurdjieff nunca saía de casa sem encher os bolsos com um bom suprimento de bombons e doces variados. Quando encontrava uma mãe com seu filho, ele sempre oferecia um bombom ao pequeno. Se a criança a oferecia a sua mãe, ele lhe dava mais duas. Mas se a criança não oferecia nada, ela ganhava só uma. Por esse costume, era conhecido, em seu bairro, como Monsieur Bonbon. O sentido mais profundo dessa forma inusitada de agir com as crianças poder ser entendido nesse seu comentário durante o período da ocupação nazista em Paris:
“Eu sempre tenho bombons em meu bolso. Quando vejo uma criança eu dou alguns para ela. Com a criança, há sempre alguém, pai, mãe, tia. Sem exceção, todos dizem a mesma coisa para a criança: "O que você diz?" Automaticamente, pouco a pouco, a criança diz obrigado a todos e não sente mais nada. Isso é uma coisa idiota. (...) Quando uma criança quer dizer obrigado para mim, eu a entendo. Ele fala um idioma que eu entendo e é que a linguagem que eu amo. Só para ouvir isto, só para ver seus impulsos, eu gasto todos os dias cinco quilos de bombons, para os quais eu tenho de pagar 410 francos por quilo. Só para ver esses impulsos. Mas quando se diz a uma criança: "O que você diz?", você mata tudo. (...) Eles matam a criança para o futuro, e eles matam minha boa vontade. Isso é um bom exemplo, você sabe. Eu não sei como você entende isso, mas para mim é muito característico. Eu digo isso como um exemplo. As pessoas preparam tudo automaticamente, elas fazem as crianças funcionarem como campainhas que soam quando alguém as pressiona, como um botão de pressão elétrica."
Transcripts of Gurjdieff’s Meetings 1941-1946, pg 83.
Gurdjieff enfatizava a importância da educação sexual na formação da criança:
"A lei exige que o seu filho vá à escola. Deixe-o ir! Mas você, como pai dele, não deve se contentar com a escola. Por experiência, sabe que a escola dá apenas saber, informações, desenvolvendo apenas um único centro. Deve, portanto, se esforçar para que todo esse saber se torne vivo e completar o que falta. Essa é uma forma de acomodar as coisas, mas, às vezes, é melhor do que nada.
A educação das crianças suscita um grande problema, no qual temos até medo de pensar. Uma curiosa particularidade da educação moderna é que, em relação ao sexo, as crianças crescem sem direção. Vemos o que resulta de tal educação. Pela nossa própria experiência, todos sabemos que esse aspecto importante da vida está inteiramente desvirtuado. E raro encontrar um homem que, sob esse aspecto, seja normal.
Essa deterioração se faz progressivamente. As manifestações do sexo surgem, numa criança, desde os quatro ou cinco anos, e, sem direção, ela pode enveredar por um mau caminho. É o momento de começar essa educação e sua própria experiência está aí para ajudá-lo. E muito raro que, nesse sentido, as crianças sejam educadas normalmente. O seu filho muitas vezes lhe causa aflição, mas você nada pode fazer. E quando ele próprio começa a compreender o que é certo e o que é falso, muitas vezes é tarde demais: o mal está feito.
Guiar as crianças em relação ao sexo é coisa muito delicada, porque cada caso particular exige um tratamento diferente e um profundo conhecimento da psicologia da criança. Sabendo-se pouco, arrisca-se muito. Explicar ou proibir algo equivale muitas vezes a pôr uma idéia na cabeça da criança, a despertar a sua curiosidade, impelindo-a ao fruto proibido.
O centro sexual desempenha um papel muito grande na nossa vida. Setenta e cinco por cento dos nossos pensamentos provêm desse centro e dão colorido a todo o resto. Só os povos da Ásia central são isentos dessa anomalia. Lá, a educação sexual faz parte dos ritos religiosos, e os resultados são excelentes."
Gurdjieff fala a seus alunos, pg. 130 a 131.
Sobre a educação sexual existem várias referências nos livros de Gurdjieff, como a descrita abaixo:
"Se um adolescente satisfaz sua concupiscência, ainda que uma só vez, antes de sua maioridade, acontecer-lhe-á o mesmo que ao Esaú da história, que por um prato de lentilhas, vendeu seu direito de primogenitura, isto é, o bem de toda sua vida."
Em seus textos, Gurdjieff aponta que, no passado da humanidade, era considerado como principal obrigação dos pais educar seus filhos, na infância e na juventude, a não praticarem a masturbação, de modo a terem, na vida adulta, um psiquismo saudável e colocava que uma das principais causas da masturbação é a dificuldade dos pais de conversarem com as crianças sobre a questão sexual, como se pode ver no trecho a seguir:
"Devemos notar aqui, meu filho, que uma das causas principais do estado no qual se encontram os seres da civilização contemporânea é o onanismo... que, nos últimos tempos, assumiu o caráter de uma epidemia é ela mesma a consequencia da educação deles, que tem por princípio inculcar a idéia funesta, profundamente enraizada no consciente de cada um, que é preciso evitar, a todo custo, falar às crianças da questão sexual.
(...)uma regra de vida diária de sua invenção, que chamam 'bom-tom'. Esta funesta invenção criou tão profundamente raízes no psiquismo das massas que ela se tornou orgânica e se transmite por hereditariedade de geração a geração, de sorte que hoje em dia seus favoritos, cuja vontade se tornou tão débil, não podem, mesmo que o decidam conscientemente, renunciar a esta anormal concepção, ancorada em seu psiquismo, que falar a seus filhos de 'questões sexuais' é dar prova de grosseria.
Como? Falar a seus próprios filhos de questões sexuais? Mas não há nada de mais 'indecente'!"
Do Todo e de Tudo, Primeira Série, G.I. Gurdjieff, pg. 973 e 978.
Em outro trecho, ele trata sobre a maturidade do ser humano, destacando a importância da educação sexual:
"Até sua maioridade, o homem não é responsável por nenhuma de suas ações, boas ou más, voluntárias ou involuntárias, delas só são responsáveis aqueles dentre seus próximos, que assumiram, conscientemente ou pela força das circunstâncias acidentais, a obrigação de prepará-lo para uma vida adulta.
"Os anos da juventude são para todo ser humano, do sexo masculino ou feminino, o período concedido para desenvolver até a completa maturação, o germe concebido no seio materno.
"A partir desse momento, isto é, desde que se completou esse desenvolvimento, o homem torna-se pessoalmente responsável por todas as suas manifestações voluntárias e involuntárias.
"Segundo as leis da Natureza, descobertas e verificadas no decurso de longos séculos de observação por homens de razão pura, esse desenvolvimento termina, para os seres do sexo masculino, entre vinte e vinte e três anos e para os seres do sexo feminino, entre quinze e dezenove anos, segundo as condições geográficas do local de seu nascimento e de sua formação.
"Como o haviam reconhecido os homens sábios das épocas passadas, esse prazo foi fixado pela Natureza, de conformidade com as leis, para aquisição de um ser independente, dotado de responsabilidade pessoal para com todas as suas manifestações. Infelizmente, hoje em dia, não se leva mais isto em conta e, a meu ver, isto provém, principalmente, da negligência que se evidência na educação atual, com relação ao problema sexual, que nem por isso deixa de desempenhar o papel mais importante, na vida de cada um."
Encontros com Homens Notáveis, G.I. Gurdjieff, pg. 59 a 60. |
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